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quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Ética e Moral

Como é que a moral se pode transformar na ética?


O psicólogo Lawrence Kohlberg (1927-1987) propôs-nos três grandes níveis de desenvolvimento moral, cada um composto por dois estádios. Estes três níveis constituem diferentes tipos de relações entre o sujeito e as regras e as expectativas da sociedade.

O primeiro é o nível da moralidade pré-convencional que diz respeito à maioria das crianças com menos de nove anos, a alguns adolescentes e a um grande número de criminosos, adultos ou adolescentes. Neste nível as regras e as expectativas da sociedade são exteriores ao sujeito.

O segundo é o nível da moralidade convencional que diz respeito à maioria dos adolescentes e adultos. Aqui o sujeito interiorizou as regras e as expectativas dos outros, nomeadamente as das autoridades.

O terceiro é o nível da moralidade pós-convencional. Diz respeito a uma minoria de adultos a partir dos vinte anos de idade. Neste nível o sujeito distanciou-se das regras e das expectativas dos outros e define os valores em termos de princípios universais livremente escolhidos.


No nível da moralidade pré-convencional o primeiro estádio rege-se por uma orientação punitiva e pela obediência à autoridade: para evitar as punições que são temidas como qualquer outro estímulo aversivo, o sujeito obedece a pessoas investidas de prestígio ou de poder, habitualmente os pais, é incapaz de ter em conta intenções e crê na responsabilidade objectiva. Neste nível, o segundo estádio rege-se por uma orientação ingenuamente hedónica e instrumental. As acções são definidas como justas se esta definição satisfaz o eu e, acessoriamente, as outras pessoas. Pode haver partilha e reciprocidade, mas trata-se de uma reciprocidade egoísta pela qual as relações humanas são assuntos de comércio segundo o princípio "é preciso dar a quem dá". Não existe neste estádio verdadeira reciprocidade baseada na lealdade, na gratidão, na justiça, na generosidade e na simpatia.


No nível da moralidade convencional, no primeiro estádio, o sujeito orienta-se em função das relações (moralidade da simpatia). Acha que age bem se é "gentil", se agrada ao outro, se ajuda os outros e se os outros o aprovam. Fundamenta sempre os seus juízos quanto à natureza do bem e do mal sobre as reacções do outro, preocupa-se mais com a sua aprovação ou desaprovação do que com o seu poder físico. Conforma-se à maioria e aos comportamentos óbvios ou evidentes. O sujeito começa a ter em conta as intenções pelo julgamento dos comportamentos dos outros. Neste nível, o segundo estádio diz respeito à moralidade da autoridade e da manutenção da ordem social. O sujeito aceita sem condições as convenções e as regras sociais para evitar a censura do outro. Já não se conforma aos padrões de outros indivíduos: submete-se à ordem social como tal. É a moralidade da lei e da ordem. Os comportamentos são tidos como bons se se conformam a um conjunto rígido de regras, se o sujeito cumpre o seu dever, se respeita a autoridade e mantém a ordem social. O sujeito subordina as suas necessidades de pessoa individual ao ponto de vista do grupo ou de uma relação partilhada.


O nível da moralidade pós-convencional é o da autonomia e dos princípios morais pessoais.
No primeiro estádio deste nível domina a moralidade do contrato social, dos direitos individuais e da lei democraticamente aceite. Há flexibilidade das crenças morais que faltava nos estádios anteriores. A moralidade baseia-se no acordo entre as pessoas, prestes a conformarem-se a normas que lhes parecem necessárias para manter a ordem social e os direitos dos  outros. Não há rigidez de normas. No entanto a lei deverá prevalecer em caso de conflitualidade apesar de a acção justa ser definida em termos de direitos individuais e de critérios examinados criticamente sobre os quais a sociedade entrou em acordo. O segundo estádio deste nível corresponde à orientação por princípios éticos universais. Aqui o comportamento é controlado por um ideal interiorizado que solicita a acção e que é independente das reacções do outro. Este ideal interiorizado representa a crença do sujeito no valor da vida e está marcado pelo respeito para com o indivíduo. Tem em si os princípios universais de justiça, de reciprocidade, de igualdade, de dignidade dos seres humanos considerados como pessoas individuais. É o estádio de moralidade mais elevado possível e que, tanto quanto se sabe, apenas pertence a uma minoria de pessoas adultas. A moral, nesta situação, é uma ética prática,  como a física é matemática aplicada, isto é, vivida. 


Potencialmente todos os seres humanos podem aceder ao estádio de moralidade do topo da pirâmide, assim se abra caminho para tal, pela destruição das barreiras sociais, económicas e culturais que leva os indivíduos à educação, à solidariedade e ao conhecimento.


Provavelmente com mais cultura, educação, arte e ciência, a pirâmide Kohlbergiana poderá inverter-se e talvez passemos a apreciar melhor os frutos que a vida nos dá, só possível pela vivência do imperativo kantiano:  age de tal modo que trates a humanidade, tanto na tua pessoa como na do outro, sempre como um fim e nunca como um meio. Ou como   também escreveu Pessoa: 
    O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.
    Quem está ao pé dele está só ao pé dele.
       Alberto Caeiro


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