Páginas

quinta-feira, 14 de junho de 2012

poesia

POESIA

A poesia pode ajudar 
toda a gente,
oprimidos e angustiados,
alegres e redimidos,
resignados e coitados,
malvados e explorados,
ingénuos e astutos,
esperançados e pessimistas.

A poesia é o início e a continuação 
da pura revolução,
liberdade em movimento, 
é democracia
em estado original.
É árvore, aroma e bruma,
chuva, luz, estrela, lua.
Flor, criança na rua.
Poesia há só uma, 
a verdadeira e mais nenhuma.


quinta-feira, 7 de junho de 2012

ontologia

A ontologia é a área de estudos que visa responder às questões:

1- O que é que há?
2- Porque é que há o que há?
3- Porquê o ser e não o nada?

O problema mais premente de qualquer ser humano é a determinação do seu ser pela resposta a questões existenciais através da sua prática de vida. Cada movimento que fazemos, cada olhar que projetamos, cada pensamento que nos ocorre, são respostas a questões implícitas ou explícitas. Mesmo que façamos qualquer coisa sem a ter pensado, esse fazer é uma resposta a uma pergunta implícita. Essa resposta é, nesse preciso momento, o fundamento do não ser de todas as outras possibilidades. Se a resposta for previamente pensada e determinada pela reflexão depois de ponderados a origem, o meio e o fim, então estamos a ser verdadeiramente humanos: racionais e conscientes, para além da irracionalidade ou inconsciência. O caminho que trilharmos é deste modo derivado de um processo ontológico. 

Não é possível escolher um caminho sem responder àquelas três questões.

O que é que há?
Cada ser humano tem na sua mente um conjunto mais ou menos delineado do que entende que há, dentro daquilo que legitima como existente. Para uns há deuses, centauros, quimeras, para outros há árvores, rios, terra, planetas. Para outros ainda poderão existir todos os tipos de realidade independentemente do seu grau de ser. Se não existirem deuses, com certeza não farão qualquer sentido os rituais que os invocam. Contudo há formas de realidade que não são dadas diretamente, nunca ninguém viu um eletrão ou um neutrão, nunca ninguém viu o deus ou o momento em que se terá iniciado o universo pelo big bang. Estas formas de realidade são o resultado e um processo de longas experiências e meditações. Mas ninguém pode sequer sobreviver durante um tempo razoável sem a sua ontologia, ainda que não conheça sequer o que significa ontologia.

Porque é que há o que há?
Esta questão leva-nos mais longe do que a simples elaboração de uma lista dos nossos existentes. Leva-nos a uma fundamentação. Consequentemente teremos de elaborar um argumentação que justifique as nossas opções. Essa argumentação terá de compreender premissas e conclusões que sejam aceitáveis, não apenas por nós, mas por qualquer ser humano que, conscientemente tente seguir o fio condutor dos argumentos. A historialidade, a mudança, as metamorfoses, são elementos essenciais que entram nesse corpo argumentativo. Poderemos perguntar porque é que há deuses, qual a sua natureza, função e finalidade. Dum modo geral existe tudo o que é de natureza material e energética e também tudo o que daí deriva. Há cérebro e mente e consequentemente todos os pensamentos, sonhos, ideias e ilusões neles contidos. Este trabalho de resposta de fundamentação de tudo o que há é um tarefa sem fim para a humanidade e só termina individualmente com a morte.

Porquê o ser e não o nada?
Esta questão creio que tem uma resposta no campo da fenomenologia. A causa última ou primeira do ser ou do nada não faz sentido procurá-la. O que nos dá a resposta a esta questão é um conjunto de evidências a partir de um fundo empírico e de uma constatação da consciência enquanto processo intencional. A origem do mundo e da vida, a finalidade de todos os processos mais ou menos complexos no vasto universo que somos nós e tudo o que nos rodeia serão sempre possivelmente um mistério. É este mistério, qualquer coisa inominável ou absurda, que suporta a vida e que leva os seres humanos em geral a quererem descobrir e inventar sempre mais e mais. Fernando Pessoa disse-nos que o maior mistério é haver quem acredite no mistério. Os mistérios são alimentados e suportados pelos mitos que explicam o nada e o tudo.

A ordem das questões aqui colocadas não significa que umas sejam primeiras ou mais importantes do que as outras, é arbitrária, tal como os pensamentos e imagens que vão emergindo nos sonhos que aparentemente não têm nexo racional nenhum. Contudo creio que ninguém resolve nenhum problema de fundo, muito menos de relações interpessoais mais ou menos complexas, se não passar por tentativas sérias de respostas àquelas questões. No fundo por tentar, por todos os meios ao seu alcance, combater o esquecimento e a ignorância, o maior dos males e raiz de todos os outros.

domingo, 3 de junho de 2012

prometeu



(a propósito das valas comuns na Síria)

Há por aí uma espiral
Gira e rodopia num absurdo sentido
Valas comuns
Flores de maio regurgitando a náusea do desamor
Moscas em olhos de crianças
Mãos de sangue, corações empedernidos
Terra triste, lamacenta, pestilenta
Humanismo ismo ismo
Poeira do universo num verso inverso
Mundo imundo furibundo
Terra tela telúrica
Para onde escorreu o teu leite
Mãe dos deuses e das quimeras
Aquele leite quente que amamenta
As crianças de idade tenra como a alface
Coalhou e endureceu
À força de Prometeu
Instrumento fundamental da civilização
Onde falta o pão, onde falta o pão
Há por aí buracos negros
Absorvendo o tutano dos homens
Criando lobisomens
Escurecendo o brilho da vida
Enquanto os povos ainda cantam
Os amanhãs e as primaveras
Hediondas hediondas
De  giocondas e anacondas
Nas ondas do mar que não é nosso
Caímos no fosso, no fosso
Sopa de osso osso            
Ouço caroço
Caracol de corninho ao sol
Lesma cascuda
Por isso te queimaste
E agora jazes como se nunca tivesses existido
Como se nada mas nada te fosse prometido e tudo a ti permitido. 

natureza morta



Duas bananas
Dez laranjas
Onze peras rocha
Seis maçãs amarelas
Quatro maçãs vermelhas
Quatro laranjas podres
Uma maçã amarela bichada.

Peguei naquelas quatro laranjas
E nessa maçã.
Já não eram laranjas
Já  só era meia maçã.

As que ficaram no fruteiro não se importaram.
Conformaram-se com o destino:
Serão tragadas por uma boca qualquer.
Não têm sistema nervoso
Mas têm casca e pele.
Nasceram, viveram e estão a morrer
Tal como nós,
Dentro da película fina ou cascuda que nos envolve.
Afinal não há diferença ôntica entre nós e a fruta, comida ou por comer.