Porque nos aproximamos da época natalícia, ocorreram-me algumas palavras que talvez mostrem que o Natal é, não só das crianças, mas também da criança que vive em cada um de nós.
O NATAL E AS CRIANÇAS
As crianças correm, saltam, riem, choram,
vivem desmedidamente, dançam à chuva,
brincam nas poças de água, espantam-se
com a beleza de todas as coisas,
acham tudo natural, criam formas de arte incríveis.
Abraçam- se, dão miminhos, dormem que
nem ratinhos, sonham com baloiços,
com passeios nas nuvens e com passarolas voadoras.
Brincam a tudo, aos médicos e enfermeiros,
aos professores, aos pais e às mães,
aos super-heróis, aos irmãos.
Querem ser, quando forem grandes,
astronautas, polícias, bombeiros,
pilotos de fórmula um, maestros da banda filarmónica.
Têm o mundo a seus pés,
são príncipes e princesas, fadas e gnomos,
espadachins a surpreender monstros numa floresta encantada.
As crianças dançam de roda de mãos dadas,
jogam ao pião, ao berlinde, ao salta carneiro,
ao mata, às escondidas.
Perguntam porque é que chove,
porque é que quando salto caio outra vez,
porque é que há pessoas que morrem,
porque é que o céu é tão azul?
Procuram o lugar do infinito,
a razão do frio, a origem do mundo.
Dizem-nos, com ternura e curiosidade:
O meu avô, que não conheci, é aquela estrelinha no céu?
As crianças parecem pequenas e estão a crescer,
têm o mundo todo dentro delas.
As crianças acreditam no menino Jesus
e no Pai Natal, acham tão natural o
voo dos pássaros como o dos foguetões.
As crianças trocam prendinhas insignificantes
por amor, por pura paixão,
cromos, caricas, bichos-da-seda,
pratinhas dos chocolates do Pai Natal.
Têm os cadernos da escola altamente coloridos
porque a vida não pode ser triste e cinzenta.
As crianças são sindicalistas de primeira
água, conseguem o que é de justiça,
com um sorriso apenas.
Sabem que somos todos iguais e todos diferentes.
As crianças acreditam que todos têm pai
e mãe a sério, que os médicos não morrem,
que os professores sabem tudo,
que os animais são nossos amigos.
As crianças têm paciência infinita,
fazem castelos de areia que a água deslaça
e a seguir constroem outro e outro.
Não se cansam de transportar repetidamente
o balde com água do mar e lançá-la,
sem desistir, no poço que se esvai na praia,
Vivem, com alegria, o mito de Sísifo,
sem cruzes pelo caminho.
As crianças são cientistas corajosos
como Galileu, defendem que a terra
é redonda e se move,
mesmo que sejam castigadas por isso.
As crianças sorriem a sonhar com doces,
pipocas, gomas, romãs e marshmallows,
com as prendinhas do pai Natal, com
as luzes cintilantes de muitas cores nas
árvores da avenida e com a neve na serra.
As crianças ensinam- nos tanto;
e às vezes não queremos aprender,
elas sabem que são o futuro
e nós também sabemos porque já
somos muito passado enraizado na memória.
De vez em quando tenho esperança que toda a gente sinta,
como por vezes sinto, que o mundo é das crianças,
por elas não há fome, não há guerra, não há medo,
só há vida intensamente vivida,
só há Amor como no espírito de Natal.