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quarta-feira, 25 de novembro de 2020

ÁRVORE


Quando era menino, 

às vezes apetecia-me ser árvore.

Só porque as árvores podem ser altas

e quanto maiores são as suas raízes

mais alto chegam, e aí podem conviver

em abundância com os pássaros.

As árvores ondeiam ao sabor da seiva, 

com suas raízes, seus ramos,  

suas folhas, flores e frutos.

Serpeiam como o vento a ventar, 

como a maré subindo e descendo 

na infinitude do mar.

Seria árvore e,  à noitinha, 

sentiria a insistência da Lua 

com o seu luar na floresta 

semeado de  faiscantes 

cristas de luz viva e clara.

E aí teria  o sonho da Terra inteira,

sem fronteiras, vivaz, solidária, 

fraterna e livre, como a utopia séria. 

Terra forte e farta, onde se cantaria 

e dançaria sem preconceito 

como os pássaros, num rodopio amoroso

onde todos seriam do mundo 

que não é de  ninguém; 

só bons selvagens 

como a floresta da natureza,

 nossa mãe.

segunda-feira, 9 de novembro de 2020

novembro

Quando olho para a cara das pessoas

e não gosto do que vejo, desconfio,

quando gosto, acredito.

Não é que queira, não posso decidir 

os desejos,  meus ou de quem quer que seja.

Às vezes é preciso olhar, ver, contemplar, 

procurar o infinito que há em tudo.

E então surgem as palavras, nascem e crescem

como cogumelos, cristais, cerejas, conversas.

Não são retratos de coisa nenhuma.

Não são teatros da realidade, são a realidade no palco.

São manhãs frias de novembro com o chão do quintal

cheio de lágrimas do tempo com folhas amarelas de melancolia.

São tardes tão lúgubres que nem as saudades matam,

são noites de intempérie à espera da queda de todas as máscaras.

Às vezes sinto este novembro nos ossos como se fosse dezembro sem natal.

E dá-me para perguntar:  que mal fizeram a Deus os inocentes?