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segunda-feira, 1 de abril de 2024

DESEJOS

À saída do supermercado fui inquirido sobre três desejos.
Deseja um saco?
Deseja fatura?
Deseja pagar com a nossa aplicação?
Apeteceu-me dizer, mas não disse, digo agora.
Desejo paz e amor, desejo que todas as guerras acabem já.
Desejo que a mentira, a hipocrisia, o cinismo, o roubo e a exploração terminem neste momento para nunca mais se repetirem.
Desejo que consigamos partilhar ideias, modos de produção, riqueza, cultura, educação.
Desejo saúde para todos, respeito, igualdade máxima, liberdade máxima, para todos, sem exceção.
Desejo que acabe já o racismo, o machismo, a xenofobia, o discurso de ódio e a caça às bruxas.
Desejo, do fundo do coração, que toda a gente sinta e deseje do fundo de todos os corações, que sejamos efetivamente todos iguais e todos diferentes.
Desejo que ninguém ache nem sinta que a pessoa humana é egoísta, egocêntrica, gananciosa, mesquinha, pérfida, manhosa.
Desejo tantas coisas, uma Natureza cuidada, acarinhada e respeitada.
Desejo ar puro para respirar, água boa para beber e para nadar, paisagens sublimes que perdurem e nos encantem durante muitos e muitos anos.
Creio que quase toda a gente comum deseja coisas, assim simples, como um beijo, um abraço, uma declaração de amor, uma chispazinha de um olhar amigo.
E os desejos que nos sugerem explicitamente são sacos de plástico, faturas eletrónicas com número de contribuinte, modos de pagamento e pseudo-felicidade empacotada.
Este é o mundo dos desejos com preço, evidentemente manipulado, como se a felicidade se pudesse comprar, faturar e pagar com uma aplicação eletrónica ou com a adesão a não sei quanto por cento de desconto em cartão.
Os valores principais, éticos e morais, por serem bons, não têm preço, por isso quem os tem não os vende, por conseguinte, quem nos quer vender tudo e mais um par de botas, não nos pergunta os verdadeiros e éticos desejos, é que não dão lucro fácil e imediato.
©PR
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Nota: Os trabalhadores merecem sempre todo o respeito, esta crítica não é para eles, mas para quem tem poder para os “obrigar” a repetir a mesma frase, centenas ou milhares de vezes por dia: “Deseja um saco? Deseja fatura?” Deseja... ?