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terça-feira, 3 de maio de 2016

a deusa deve ser bela



Afrodite de Cnido


da aziaga natureza
levo as selvagens chicotadas 
os empurrões do vento
o frio glaciar dos invernos
o crocitar dos corvos loucos
a dor finíssima do fio da navalha
encaro o poder de Zeus
na inconsistência de tudo
a que não me posso furtar
de olhos secos e inamovíveis 
vejo turvo e sinto socos de angústia
nas internas paredes do estômago
sou náusea sem fim
embalagem de ladras invisíveis
que me levam os dentes, os nervos 
pedaços de pele e cabelos pretos
liquefaço-me a cada instante
vou escorrendo pelos muros do universo
como a água de Heraclito
recorro, cadáver cinético
a Afrodite para me compor
(a deusa deve ser bela).

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