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sábado, 28 de fevereiro de 2015

responsabilidade moral

     Elementar é a ideia que já Sartre (1906-1980) defendeu: o homem está condenado a ser livre. Não há como não decidir, e mesmo decidir não decidir é já tomar uma decisão. Significa isto que cada um é responsável inteiramente pelos seus atos, não é possível alijar culpas ou responsabilidades para fora da esfera do eu. Sou inteiramente livre e nessa medida sou inteiramente responsável pelos meus próprios atos. Encontro-me absolutamente só nas decisões que tomo e na assumção das consequências que delas poderão advir. A responsabilidade é a obrigação que tenho de responder por todos os meus atos ou omissões e por todas as suas consequências perante a autoridade que pode ser a consciência moral ou qualquer outra.
       Na Bélgica, por exemplo, desde 2002, a eutanásia é legal para situações de extremo sofrimento físico e psicológico em casos de doença terminal confirmada pelas autoridades médicas. Houve dois gémeos surdos de 45 anos que em 2012 pediram para morrer porque ambos sabiam que iriam ficar cegos o que os impediria de trabalhar e de comunicar gestualmente. Esta situação confirmada pelos médicos com 100% de probabilidade de ocorrer, foi por eles considerada intolerável por ultrapassar os limites do aceitável. As questões morais que se colocam aqui são várias:  1- os gémeos teriam ou não direito à morte medicamente assistida para acabar com o sofrimento que consideram intolerável? 2- qual o fundamento moral para a equipa médica autorizar o processo de eutanásia? 3- há ou não responsabilidade moral por parte das pessoas envolvidas nesta situação, os gémeos e a equipa médica, diretamente, e os próprios legisladores indiretamente? A lei que permite a eutanásia poderá fundamentar-se numa ética consequencialista que comanda a ação pelas consequências que advierem da operacionalização das decisões. As éticas consequencialistas ou materiais não produzem morais infundadas, pelo contrário, apresentam critérios de moralidade e não negam a responsabilidade. Baseiam-se nas previsões das consequências dos atos que daí advierem, por isso, se admitirmos que a finalidade dos seres humanos é a felicidade, podemos concluir que os gémeos, não recorrendo à eutanásia, seriam infelizes, o que contraria a causa final da sua própria vida. O sofrimento psicológico é o contrário da felicidade, e não havendo a menor réstia de esperança para a encontrar nesta situação concreta, resta por termo à situação real de impossibilidade de se ser feliz, neste caso, recorrer à eutanásia. Os gémeos assumem inteiramente as consequências das suas decisões ao limite extremo ao anteciparem a sua morte, pondo fim ao sofrimento e também à sua existência, por isso podemos falar em responsabilidade moral. A equipa médica, na medida em que concordar moralmente com os fundamentos da eutanásia, estará também, respeitando a vontade dos gémeos, a ser responsável do ponto de vista moral. Também os legisladores, que eventualmente tenham fundamentado filosoficamente a lei da eutanásia, estarão a ser responsáveis moralmente porque, tal como qualquer ser humano são responsáveis pela lei que produziram e a isso nunca se poderão furtar.
     Contudo existem outras éticas de sinal contrário que são as éticas deontológicas ou formais que veem o valor e a reponsabilidade morais na perspetiva das causas (intenções) e não das consequências das ações, o que nos levaria a considerar que nesta situação concreta da eutanásia não haveria responsabilidade moral se se considerasse a vida como o valor supremo a manter independentemente das consequências desta ideia. Pôr termo à vida, mesmo que através da eutanásia, seria contrário à lei moral.

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