Descartes afirma que foi persuadido pela Razão
a rejeitar todas as coisas em que se lhe depare qualquer razão de dúvida, tanto
“às abertamente falsas” como àquelas “que não são completamente certas e
indubitáveis”. Mostra-nos que não tem que analisar ou percorrer cada “uma em
particular”, já que seria uma tarefa ou trabalho sem fim. De facto, quando os “fundamentos”
de um edifício estiverem minados, todo o edifício ficará em risco de ruir. Por
isso Descartes afirma que atacará imediatamente todos os princípios em que se apoiava
tudo aquilo em que acreditava. É esse o início do processo da dúvida cuja
natureza é metódica, provisória, radical e hiperbólica. O alcance da dúvida
atinge todas as crenças e fundamentos. Descartes coloca tudo em dúvida,
inclusivamente a sua própria existência enquanto corpo e alma. Mas de que serve
duvidar assim, de uma forma tão radical? Qual a utilidade da dúvida? A dúvida é
necessária porque é uma tomada de consciência dos erros e ilusões que tolhem o
acesso à verdade e impedem o sujeito de atingir o conhecimento verdadeiro. É
radical porque não pode deixar nada de fora, nem mesmo as ideias de natureza
metafísica, que se encontram na base da “árvore da sabedoria”. Por conseguinte,
a utilidade da dúvida manifesta-se na medida em que ela permite encontrar
aquilo que resiste a toda a prova de desconfiança: o cogito, fundamento primeiro,
crença fundacional sobre a qual se pode erigir todo o edifício do conhecimento.
Pela dúvida Descartes encontra uma certeza inabalável pela qual vem a saber que
as ciências podem, guiadas pela Razão, conhecer verdadeiramente o mundo, criado
e mantido por Deus que garante a verdade.
quarta-feira, 13 de novembro de 2019
Descartes - Deus e o Cogito
O cogito é uma certeza subjetiva expressa na
fórmula “penso, logo existo”. No cogito ou substância pensante encontra-se a
ideia de Deus que é inata. Tal ideia contém os atributos de Deus: é um ser
perfeito, omnisciente, omnipotente, e sumamente bom. A certeza deriva do
caráter inato e a priori das ideias contidas no cogito que são uma espécie de sementes da
ciência colocadas em nós por um Deus verdadeiro, descobertas por intuição. Deus
é, assim, a garantia do mundo e da verdade acerca desse mundo, por intermédio
do cogito. A verdade dos enunciados científicos só é possível, para Descartes,
devido à relação recíproca existente entre o cogito e Deus. Deus criou o mundo
e garante a sua subsistência, ao mesmo tempo colocou no homem a ideia de si
próprio, ser perfeito, e todas as outras ideias inatas, como as matemáticas,
pelas quais se pode produzir ciência que não é mais que o estudo do mundo
decantado pelo pensamento racional.
Dogmatismo e Racionalismo
O dogmatismo é uma posição acerca do
conhecimento que afirma que ele é possível e real. Por isso se diz que os
dogmáticos, em princípio, não colocam o problema do conhecimento, não fazem a
pergunta “O que é o conhecimento?” e muito menos uma outra “Será possível o
conhecimento?” Contudo, ao fazermos estas perguntas teremos necessariamente de
responder-lhes. O dogmatismo afirma que o conhecimento é possível, mas não
explica como é que ele acontece. Para explicar o conhecimento, não apenas como
possibilidade, mas como realidade, há que ir mais longe e buscar as origens do
mesmo. Desta feita, há duas teorias opostas que tematizam o problema: o
empirismo e o racionalismo. O primeiro afirma fundamentalmente que a origem do
conhecimento são as impressões e que elas estabelecem o limite do nosso
entendimento. Daí que o empirismo em geral desemboque numa forma de ceticismo, ainda que moderado, não negando a possibilidade de conhecimento
verdadeiro. Já o racionalismo afirma claramente que a razão é a origem e o
fundamento de todo o conhecimento. Para os racionalistas, na medida em que as
ideias fundamentais são a priori (inatas), descobrem-se pela intuição
intelectual, o conhecimento constrói-se de forma dedutiva num esquema em que o
sujeito se impõe ao objeto, há uma correspondência entre o pensamento e a
realidade. Assim pode dizer-se que o racionalismo é também uma forma de
dogmatismo porque confia absolutamente na razão para atingir a certeza e a
verdade. Contudo dogmatismo e racionalismo são diferentes: para um
racionalista, como Descartes, o dogma é o fim e não o princípio, já para o
dogmático ingénuo, o dogma é o princípio e o fim do conhecimento.
segunda-feira, 7 de outubro de 2019
avenida da liberdade
Nesta avenida
por onde caminho,
a meu lado seguem,
as tuas mãos
a meu lado seguem,
as tuas mãos
assertivas,
os teus olhos doces
os teus olhos doces
e os teus lábios
de voz madura.
Aqui sinto,
Aqui sinto,
mesmo sem te ver,
a paz dos pensamentos
que se desenha
nas nossas caminhadas
que só morrerão
quando nada formos.
domingo, 6 de outubro de 2019
manifestação
Nesta avenida pura,
de plátanos e pássaros,
passeia lúcida a vontade
de amores-perfeitos,
rosas e cravos vermelhos.
Solidários numa revolução,
os bombos dos corações
em ordem unida,
como bandos de gaivotas
ondulando, subindo e descendo,
caindo e subindo no vento,
indo e vindo no tempo
apaixonado pela liberdade.
terça-feira, 30 de julho de 2019
pesadelo
Assombra-nos a guerra,
cume de toda a imoralidade.
Violentos e artificiais vulcões,
carregados de infâmia, rasgando
montanhas ululantes de pássaros feridos
despedaçam-nos o coração.
A grande mão invisível
obriga o sangue a galgar das veias,
varre toda a beleza,
exclui todos os sorrisos,
arrasa todo o sentido da vida e a morte.
Neste jogo, incrédulos,
caem-nos em cima perguntas sem resposta.
A consciência mergulha
num mar pérfido e tenebroso sem fim,
exala, como medusa implacável,
um cheiro entranhado
de apocalíptico desânimo.
Não valeria muito mais, senhores generais,
Não valeria muito mais, senhores generais,
assumirmos o mistério que nos elegeu
e deixar-nos embalar solenemente
e deixar-nos embalar solenemente
pela elegante harmonia das esferas celestes?
sexta-feira, 15 de março de 2019
fevereiro
Fevereiro,
pequeno,
verdadeiro,
como quem diz
e vive a vida.
Não se mede aos dias,
como os homens
Não se mede aos dias,
como os homens
não se medem aos palmos.
A grandeza das suas horas
torna impossível
A grandeza das suas horas
torna impossível
a nossa solidão.
Planeta anão,
Planeta anão,
mas de deusas rodeado.
Água de fevereiro
Água de fevereiro
mata o onzeneiro.
Pois que caia,
Pois que caia,
que tanta falta faz,
que o mate,
para que o mundo
não seja imundo.
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